Elo Primitivo

segunda-feira, julho 11, 2005

Paraty além da festa do livro

Jornal do Brasil - 10/7/2005 - por Paula Barcellos
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Sob os holofotes da imprensa do mundo todo, tendas luxuosas abrigam escritores de renome internacional. Luzes especiais iluminam os caminhos de pedra ao redor da Praça da Matriz, no Centro Histórico. Crianças bem agasalhadas se protegem do frio e brincam entre bonecos gigantes, construídos com papel machê. Muitas delas com livros nas mãos. É a cidade perfeita idealizada pela Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). A poucos metros do sonho, em ruas escuras e muitas ainda de terra, esconde-se a realidade dos excluídos: meninos descalços, com os pés na lama, bermudas surradas e camisas rasgadas. Outros, com roupas simples, divertem-se em uma tenda pequena, que não chega a cinco metros quadrados, erguida no gramado –um tanto descuidado – da Praça São José Operário, no bairro Ilha das Cobras. É a primeira Feira de Livros do Instituto Tannus Assistencial e Educacional (Itae). São as duas faces da mesma Paraty. Criado há 20 anos, o Itae é o único centro de atendimento dedicado exclusivamente a jovens e crianças carentes da cidade. Através de assistência fonoaudiológica, psiquiátrica, reforço estudantil, oficinas de criação e profissionais, acolhe mais de 500 meninos, de 6 a 16 anos, de famílias com renda inferior a três salários mínimos. A instituição, abrigada numa casa de pau-a-pique no bairro Mangueira, na periferia, é sustentada essencialmente por doações e tem um custo aproximado de R$ 6 mil por mês. A coordenadora pedagógica do Itae, Antônia Silva, não acredita que haja uma segregação explícita entre a população da periferia e os participantes do evento. Mas ela torce para que, cada vez mais, as crianças carentes cheguem aos palcos da Flipinha (programação infantil da Flip): "Com a Feira de Livros, a comunidade tem mais um espaço. Nosso evento é mais um braço da Flip. Talvez, se não fosse a festa, não teríamos a idéia de fazê-la". Nas tardes dos últimos três dias, não foi difícil se emocionar na Praça São José Operário. Crianças de 6, 7 anos chegavam à pequena tenda, com sorrisos nos lábios e apenas R$ 2 nas mãos (preços dos livros à venda). Para muitos, era a primeira a aquisição de um livro novo. Para a realização da 1ª Feira de Livros do Itae, com o apoio da Caixa Econômica Federal, as editoras Casa de Rui Barbosa, Pallas, Moderna, Callis, Record e Terceiro Nome doaram os livros. O dinheiro arrecado com as vendas irá todo para a instituição. A editora Globo doou ainda mil revistas em quadrinhos que vão para a Gibiteca.