Elo Primitivo

segunda-feira, agosto 15, 2005

Marco Zero

SM


Hiroshima - Isto É
Grávida de nove meses, Fujiko estendia roupa no varal às 8h15 do dia 6 de agosto de 1945 quando foi atingida por uma violenta enxurrada de luz e calor. “Depois da explosão de luz, subiu uma nuvem de cogumelo atrás da montanha”, conta. “Ficou muito, muito quente e começou a chover cinza.” Atrás da montanha Tenjô, a 30 quilômetros da casa onde Fujiko se abrigara para ter o bebê, Hiroshima acabara de ser aniquilada pela primeira bomba atômica da história. No ataque, 70 mil morreram de imediato e 77 mil ficaram feridos. Fujiko só se deu conta da extensão da tragédia um mês depois, quando tentou voltar à própria casa, no centro de Hiroshima, com Yaeko, a filha recém-nascida.“Quando entrei na cidade, não tinha nem caminho. Encontrei montanhas de ossos, crânios por todo lado”, relata. Depois de muito circular entre escombros, Fujiko identificou sua antiga casa pelos destroços de uma pia. É que na frente da construção de madeira, Fujiko e o marido, Tsutomu Watanabe, mantinham uma barbearia. “Perto da pia de lavar cabelo tinha um cadáver queimado, todo preto. Mesmo sem certeza, enterrei como meu marido.” Como outros moradores da cidade, ela montou uma barraca no lugar, onde viveu com a filha durante três anos. No começo, só comia as provisões distribuídas pelas forças americanas. “O peixe já chegava estragado, mas eu só pensava em sobreviver. Quando vejo mendigo catando comida no lixo volto no tempo, nas tristezas acumuladas. Se a fome é muita, comida estragada não faz mal.”