Elo Primitivo

segunda-feira, outubro 18, 2004

Ela - Cláudia


A bomba explodiu, chegou no conforto de casa, num envelope pardo. Todos os sonhos se desfizeram, reencontros desativados, tudo finito nessa nossa inadiável finitude foi revelado na segunda-feira ao meio-dia. Ela foi à praia, como sempre fazia em horas difíceis, como se o mar pudesse afastar tudo de ruim ou trazer tudo de bom. Deixou o emprego de lado, isso não importava mais, nada importava mais, a não ser a certeza de que partiria e de que continuaria a sentir saudades eternamente, onde quer que se encontrasse num futuro próximo, anunciado em letras de forma no papel sem cheiro, sem cor e sem poesia, como o cotidiano nosso de cada dia...

E quando estava deitada na areia, de top less se lixando para quem quer que fosse, o celular tocou. Era do laboratório, a secretária pedia mil desculpas, greve de ônibus, confusão total, entregou o exame errado. Leu o diagnóstico pelo telefone: nada consta. Ela vestiu o biquíni correndo e engatou a quinta marcha.
No sinal vermelho olhou as notas da agenda: quatro desejos inadiáveis, uns abraços em suspenso, a viagem à Grécia. Os malabares jogavam bolinhas amarelas, quatro, que se revezavam entre a segurança das pequenas mãos e a dança no ar. Lambeu o braço, o menino deixou a bolinha cair, riu. Salgado, ela disse, tô vindo da praia. Arruma uma moeda, tia? Cláudia, é Cláudia o meu nome. Toma. Valeu!
Cláudia ligou pra chefe, dizendo que precisava de folga: problemas de saúde, compenso no sábado. Desligou. Naquele sabor de maresia se reconhecia, permanecia. Abriu a agenda, cheirou a folha com o Sol desenhado no canto esquerdo, começou pelo primeiro e mais urgente dos seus desejos...