Elo Primitivo

quarta-feira, março 16, 2005

À tarde


Fotografava quando um ponto branco apareceu na lente da câmera. Foi ver o que era. Desembrulhou a bola irregular de papel com letras escritas a lápis bicolor:
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**
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Tudo

é você
nas 4 bolas de sorvete de flocos
no ópio do quarto nos olhos
é você na memória da pele
na revolta do corpo se vingando
destruindo para se livrar de sua hierarquia
é você se repetindo em cada toque
guitarra letra cor
é você se impondo
construindo alheio ao impossível
sonho de mãos dadas no Campo
é a melodia que se aninha e procria
é você em todas as viagens na minha bagagem
é você-Sol você-norte
é a vontade que sempre renova
é o descontrole físico-químico mostrando
perigo potencial
é você me dizendo não com suas
escolhas
sou eu pedindo para me deixar partir
sou eu pedindo para não me deixar ir
sou eu consciente da loucura
amassando este papel e
jogando ao vento
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**
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Olhou em volta, não viu ninguém por perto. Uma carta de amor, nem mais, nem menos ridícula que qualquer outra. Jogou para o alto, ficou presa nos galhos da árvore. Foi embora, pensando, pensando, pensando no vento.