"Um país se faz com homens e livros"
foto: SM
Dentro do carro, chave na ignição, pé na embreagem, vejo que fotografei seus pais trabalhando: artesanato. Acelero.
O barulho do motor anuncia a proximidade. Não olho para trás, sinto que mais um acabou de passar _ vento. Mamãe e Simone escolhem bolsas, almofadas, tapetes. Não compro nada, registro. Câmera nova pendurada no pescoço ainda sem intimidade com as mãos _ pesada, grande, cheia de botões. Todo começo é tateante, um misto de curiosidade, encanto e estranhamento. Mexo apenas no automático _ por enquanto. Se eu fosse criança desmontava as peças para ver como é por dentro.
Uma joaninha pousa no meu ombro, vermelha e preta, fecho os olhos e faço pedidos, depois rio, pareço criança.
Mãos, cotovelos, pés, joelhos, tecidos coloridos espalhados pelo chão. Clico. Atrás dos tapetes pendurados, um menino, um livro, uma estória. Me aproximo, ele, concentrado na leitura, não me dá bola. Miro a máquina fotográfica. Ele espia de rabo de olho : Posso? Dá de ombros. Clico mãos. Clico livro : Dever da escola? Faz que não com a cabeça : Tem prova? Repete o gesto, indiferente. Chego mais perto : Tá lendo o quê? : 1001 noites. Desligo a máquina. Sento no chão. Abro a mochila e pego um livro. Ele acompanha os movimentos. Coloco meu livro sobre o asfalto, bem ao lado do dele : As 1001 noites! de verdade! Ouço a festa na voz, no sorriso, mãos pegando o livro, abrindo, folheando. Logo depois me dá o dele para eu ver _ cumplicidade total. Livro de escola, um fragmento de As 1001 noites, páginas amassadas, sujas, declaração de releituras.
Ele me encara e diz : Acho lindo olho azul! Volta a atenção ao livro : Capa Azul. Ri. Abre na página marcada, 181, começa a ler em voz alta, de repente pára : É a história toda? Explico que é o primeiro volume de quatro numa tradução do Árabe para o Português. Ele continua a ler.
Uma joaninha pousa no meu ombro, vermelha e preta, fecho os olhos e faço pedidos, depois rio, pareço criança.
Mãos, cotovelos, pés, joelhos, tecidos coloridos espalhados pelo chão. Clico. Atrás dos tapetes pendurados, um menino, um livro, uma estória. Me aproximo, ele, concentrado na leitura, não me dá bola. Miro a máquina fotográfica. Ele espia de rabo de olho : Posso? Dá de ombros. Clico mãos. Clico livro : Dever da escola? Faz que não com a cabeça : Tem prova? Repete o gesto, indiferente. Chego mais perto : Tá lendo o quê? : 1001 noites. Desligo a máquina. Sento no chão. Abro a mochila e pego um livro. Ele acompanha os movimentos. Coloco meu livro sobre o asfalto, bem ao lado do dele : As 1001 noites! de verdade! Ouço a festa na voz, no sorriso, mãos pegando o livro, abrindo, folheando. Logo depois me dá o dele para eu ver _ cumplicidade total. Livro de escola, um fragmento de As 1001 noites, páginas amassadas, sujas, declaração de releituras.
Ele me encara e diz : Acho lindo olho azul! Volta a atenção ao livro : Capa Azul. Ri. Abre na página marcada, 181, começa a ler em voz alta, de repente pára : É a história toda? Explico que é o primeiro volume de quatro numa tradução do Árabe para o Português. Ele continua a ler.
Minha mãe assovia, hora de seguir viagem. A voz infantil se apressa em terminar a página, engole o ar, respira palavras. Eu me levanto. Ele se levanta também e estende o livro num desamparo que me comove. Não pego, digo: Azul, capa azul : É, sem figuras : Quer? : Posso?! : Hum rum, fica de presente.
Abraço...
Dentro do carro, chave na ignição, pé na embreagem, vejo que fotografei seus pais trabalhando: artesanato. Acelero.
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Serra, relevo quente das montanhas, sol, dia bonito, frio. Pernas em movimento constante _ leis da física, do fisiológico, da fisiologia da vontade.
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Enrolo a echarpe colorida no pescoço, novinha em folha _ sensação boa de inauguração. Moska canta "tudo novo de novo..." enquanto dirijo. Gosto desse cara, tem momentos-sintonia. As duas dormem, cansadas _ satisfeitas. Noite em hora avançada, mala lotada, compras, compras, compras. Na bagagem: paisagem, arquitetura, gargalhadas, presentes, espetáculo deslumbrante: Som e Luz no Museu Imperial.
As luzes dos faróis focam o asfalto, iluminam. Só então me toco que não perguntei o nome do menino.
O meu está escrito na primeira página do livro, o dele...
O meu está escrito na primeira página do livro, o dele...
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